Na sociedade moderna, o vestibular é visto como um rito de passagem, onde o jovem é inserido no mundo profissional e adulto. Com isso, é tido como um momento de muitas expectativas e cobranças, consequentemente gerando pressão e estresse para os jovens pré-vestibulandos.
O primeiro passo para compreender o fenômeno é entender o que ocorre biologicamente com o organismo, o que é o estresse e como interfere tanto no corpo físico quanto na psique. O estresse é uma resposta biológica e natural do organismo que ocorre quando se encontra em situações inesperadas ou de ameaças, para lidar com o acontecimento o corpo desencadeia uma série de produção hormonais, entre elas a adrenalina e o cortisol, que vai se espalhando por todas as células provocando, dentre outros sintomas, a aceleração dos batimentos cardíacos e da respiração, compelindo o indivíduo ao “estado de alerta” deixando-o em condições de reagir rapidamente. O estresse pode manifestar-se por inúmeras razões, que podem estar ligados a uma situação traumática ou emergencial, por efeito colateral de alguma doença grave ou por situações do cotidiano como o ambiente escolar ou de trabalho e responsabilidades familiares (Secretaria de Estado de Saúde - Goiás, 2019).
O estresse em si não é uma patologia, porém, quando se prolonga por muito tempo, resulta no desenvolvimento de enfermidades ou no agravamento de seus sintomas. Os sintomas mais comuns são: Desordem do sono, dores de cabeça, dificuldades de concentração, dores de estômago, temperamento explosivo, falta da estima, ganho ou perda de peso, problemas de pele (urticárias), problemas de coração, pressão alta, problemas para engravidar, tristeza, aumento de risco de acesso de asma, artrite, depressão, ansiedade, entre outros (Secretaria de Estado de Saúde - Goiás, 2019).
Para Selye (1959 apud Fagundes et al, 2010), é impossível alguém viver sem sentir um certo grau de estresse, pois o estresse só desaparece da vida quando morremos. Dito isso, colocando em perspectiva que vivemos em uma sociedade voltada ao grande consumo e produção, não seria de se estranhar que os jovens desde a tenra idade seriam submetidos a pressão e estresse para se qualificarem academicamente, a fim de posteriormente estarem aptos a assumirem uma carreira de prestígio e financeiramente rentável.
Fagundes (et al 2010), desenvolveu uma pesquisa sobre estresse pré-vestibular com 20 jovens com idades entre 17 e 19 anos. Consiste na aplicação individual de um roteiro semi-estruturado e o resultado se dá por quantidade de citações durante a entrevista, dentre eles foi citado: 53,4% das vezes as Consequências e/ou Reflexos do estresse (Insônia, Dificuldades de aprendizado, Impaciência e Desânimo) e 24,9% foram sobre Cobranças e Expectativas sócio-familiares.
Sobre como lidam com o estresse: 45,8% preferem ficar sozinhos; 20,8% procuram se distrair; 8,4% choram. E quando se trata sobre as cobranças: 61,9% afirmam que estão tentando fazer o melhor; 19% disseram estarem estudando mais; 14,3% disseram que não se preocupam; 4,8% disseram que as cobranças somente os atrapalham.
A alta competitividade, escassez de vagas em universidades públicas e o valor pouco acessível em instituições privadas, fazem com que o jovem além de ter a pressão de escolher uma carreira com pouco conhecimento e idade, sofra também com o outro tipo de pressão: Estudar para se destacar e conseguir adentrar em uma boa universidade (de preferência pública ou com bolsas de estudo). O Programa de Avaliação Internacional (apud Ripani, 2019), apontou que 56% dos jovens brasileiros sofrem com estresse durante os estudos e o país ocupa o segundo lugar no quesito ansiedade.
A psicóloga Lídia Guerra (apud Ripani, 2019), coloca da seguinte forma:
“Essa é uma fase que coincide com a entrada do jovem na vida adulta. São muitas decisões a serem tomadas, podendo resultar em transtornos de ansiedade que, dependendo da frequência, acabam desencadeando também uma depressão. (...) Tudo em excesso faz mal. Quando se cobra muito, quando se exige uma perfeição acima do normal, isso se torna tóxico. A pressão que o próprio jovem coloca sob si mesmo acaba se tornando um malefício, tanto para a saúde mental quanto para a emocional dele”
Então, pode-se dizer que o jovem é condicionado a viver sua vida acadêmica sob 4 grandes pressões:
1 - Familiar: Cobram um sucesso do estudante, a fim de ser reconhecido na sociedade ( Andrade et al, 2018 apud Rocha et al, 2022)
2 - Escolar: Exigem notas altas, mas que dão pouco ou nenhum recurso para de fato o estudante se preparar para o vestibular.
Segundo a reportagem de C. Guimarães de 2015 para a Revista Época: Mais de 65% dos alunos do 5° ano da escola pública não sabem reconhecer um quadrado, um triângulo e um círculo; 60% não conseguem localizar informações explícitas em um texto. E entre os maiores do 9° ano: 90% não aprenderam a converter a medida de metros para centímetros, e 88% não conseguem apontar a ideia principal de uma crônica ou de um poema.
3 - O difícil acesso às universidades e faculdades: Como já citado em parágrafos anteriores, a alta competitividade e escassez de vagas em universidades públicas e o valor elevado das mensalidades das instituições particulares, acabam por aumentar o estresse do estudante, principalmente para aqueles que não tem condições financeiras para arcar com os custos de uma particular ou tempo para doar ao ensino de uma universidade pública.
4 - A autocobrança: Desde muito cedo é internalizado pelo próprio jovem que o sucesso está intimamente ligado à faculdade e empregos idealizados.
Em resumo, a pressão e o estresse associados ao processo de vestibular criam um efeito que atinge profundamente a vida dos jovens na sociedade moderna. Mesmo que biologicamente o estresse seja uma resposta natural do corpo, quando se soma a pressão exacerbada e a ambientes hostis, pode se resultar em uma sequência de sintomas que levam os jovens desenvolverem patologias tanto emocionais como físicas. Os dados levantados em pesquisas nos apontam a gravidade desse problema, combinando com as expectativas familiares e pessoais, as deficiências do sistema educacional e a busca por acesso às universidades e faculdades, submetem os jovens a uma grande encruzilhada em suas escaladas para a vida profissional e pessoal.
Portanto, torna-se fundamental repensar a abordagem que a sociedade tem com relação ao vestibular e ao processo de escolha de carreira. É essencial não apenas reconhecer o estresse nesse contexto, mas também adotar estratégias que minimizem essas pressões excessivas. A construção de um ambiente mais equilibrado e de apoio aos jovens durante essa fase crucial é um passo importante para garantir que o vestibular seja uma oportunidade de crescimento e aprendizado, sem comprometer a saúde física e mental dos futuros profissionais e cidadãos.
Referências:
BRASIL. Secretaria de Estado de Saúde - GO. Estresse, 21 nov. 2019. Disponível em: https://www.saude.go.gov.br/biblioteca/7598-estresse. Acesso em: 13 out. 2023.
FAGUNDES, P. R.; AQUINO, M. G. de; PAULA, A. V. de. PRÉ-VESTIBULANDOS: PERCEPÇÃO DO ESTRESSE EM JOVENS FORMANDOS DO ENSINO MÉDIO. Akrópolis - Revista de Ciências Humanas da UNIPAR, [S. l.], v. 18, n. 1, 2010. Disponível em: https://ojs.revistasunipar.com.br/index.php/akropolis/article/view/3117. Acesso em: 13 out. 2023.
GUIMARÃES, CAMILA. O ensino público no Brasil: ruim, desigual e estagnado. Revista Época, [S. l.], p. s/n, 10 jan. 2015. Disponível em: https://epoca.oglobo.globo.com/ideias/noticia/2015/01/bo-ensino-publico-no-brasilb-ruim-desigual-e-estagnado.html. Acesso em: 13 out. 2023.
RIPANI, Caroline. Pressão pré-vestibular afeta cada vez mais a saúde mental dos jovens: Conciliar a rotina de estudos, o trabalho e a vida social é um desafio para muitos e, se não equilibrada corretamente, pode ser prejudicial. Rudge Ramos - Universidade Metodista de São Paulo, São Paulo, 31 out. 2019. Disponível em: http://www.metodista.br/rronline/pressao-pre-vestibular-afeta-cada-vez-mais-a-saude-mental-dos-jovens. Acesso em: 13 out. 2023.
ROCHA, Joel Bruno Angelo et al. Ansiedade em Estudantes do Ensino Médio: Uma Revisão Integrativa da Literatura. Revista de Psicologia , [S. l.], p. 141-158, maio de 2022. DOI 10.14295/idonline.v16i60.3418. Disponível em: https://idonline.emnuvens.com.br/id/article/view/2089. Acesso em: 13 out. 2023.
Artigo: Edgard Varis
Publicado: Danyela Silva
Revisão: Amanda Gagliotti
Imagem: Internet
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